By Leo Peifer on 7/02/2007 02:34:00 PM
Eu Faço (de conta que é) Cultura


Ou até poderei fazê-la, mas terei dificuldades pródigas em mostrá-la. Esse evento da Caixa Econômica Federal nos comprovou isso. Durante vários dias, foi divulgado em jornais da capital, como Hoje em Dia e Estado de Minas, que haveria gratuitamente uma oficina de percussão (com o grupo brasiliense SomCatado), cujos participantes poderiam abrir o show de Nando Reis no Chevrolet Hall. Programão, não?

Inicialmente, foram divulgadas abertas 120 vagas. Durante as oficinas, os produtores retificaram a informação: eram 60, desmentindo os releases que provavelmente eles próprios enviaram à imprensa.

As oficinas foram marcadas para o inóspito horário de quinta à sexta-feira (das 18:30 às 22:30h). Embora eu tivesse criado muitas expectativas pelas entrevistas que li - os oficineiros diriam que não trariam nada pronto, que instigariam os participantes à criação - ensaiamos, desde o princípio, apenas duas músicas (uma delas pronta desde a década de 60). Durante dois dias de ensaio no intervalo não havia substâncias sólidas que se pudesse ingerir, havia, entretanto, café e uma infinitude de variedades de água: natural ou gelada. Essa penúria aconteceu no modestíssimo Hotel Mercure Lourdes - onde, dizem, gravaram a seletiva mineira para o último Ídolos, coisa de gente muito necessitada, portanto.

No último dia de ensaios, foi-nos dito que dez pessoas seriam escolhidas entre as cerca de trinta presentes para apresentar-se na abertura do show com o SomCatado. A sacada de mestre foi a de não designar quem seriam essas pessoas. Elas deveriam lançar mão de suas roupas mais superproduzidas, como se fossem adentrar o palco, mas dois terços desse grupo teria que usar sua superprodução em outra balada (Por que não gravaram um reality show, ó, meu Deus!). Não só não tocariam como nem poderiam assistir ao show do Nando Reis - que estava dentro do evento patrocinado pela Caixa.

Imaginem vocês como o Nando Reis deve ter sentido profundas fisgadas em seu bolso paupérrimo, a ponto de errar acordes e desafinar, quando ficasse sabendo do rombo fiscal que, dos reles 3 mil e 500 lugares do Chevrolet Hall, trinta espertinhos (selecionados pela produção para abrir o seu show) tentavam mostrar sua arte dirigida no palco sem dispender nenhum centavo! Absurdo!

Pensando nisso, os excedentes foram instados a pagar o ingresso para poder exercer a arte! Grande jogada de marketing! Você simula acontecimentos aos quatro ventos e mídias, brinca de oficinas e finge que está investindo em cultura. Para cortar gastos, impõe o rosto cadavérico da fome a seus participantes e os trata feito inúteis e incapazes. Os que forem bem comportados ganham o direito de fingir que desenvolveram algo inédito e esplendoroso - desde que paguem por isso. Ano que vem a empresa estará mendigando recursos aos Fundos de Incentivo e você - beócio - estará estampando com um sorriso iludido o portfólio divulgando uma marca que investe sobremaneira em cultura. Está inaugurada uma nova era do marketing esquizofrênico.

Comments

0 Response to ' '