By Leo Peifer on 6/06/2007 12:57:00 PM
Ludibriarte (parte 2)


Qualquer fim moral, quer dizer, de interesse por parte do artista, mata todas as obras de arte
Stendhal


O mais alto objetivo da Arte é o que é comum à Religião e à Filosofia. Tal como estas, é um modo de expressão do divino, das necessidades e exigências mais elevadas do espírito
Georg Hegel


A moral da arte reside na sua própria beleza
Gustave Flaubert

De que é capaz a arte, além de fingir a realidade? Que responsabilidades têm sobre os acontecimentos factuais? Quando é capaz de tornar-se instrumento de modificação?

Fato é que até nestas plagas houve uma polarização, entre as décadas de 60 e 70, repartida pela arte engajada e pela arte, digamos, purista. Toscamente, seria como se seus efeitos fossem forjados para órgãos distintos: enquanto uma seguia para o refluxo da mente, a outra se resignava no deleite da alma.

Em relação às críticas que se lhes faziam, enquanto a primeira era acusada de artífice de política, a objetividade de um propósito político em detrimento a subjetividade inata da arte, ainda recaía sobre si sua inerente perecibilidade, pois seria fixa a um período histórico e, portanto, fadada à obsolescência. A segunda era vista como lunática e alienada, pois não seguia o compasso conjuntural e nem propunha modificações ao estatuto das coisas vigente.

As canções de protesto desfocaram drasticamente seu objeto (se é que ainda podemos categorizar as canções mal-comportadas contra o sistema de hoje como tal). O inimigo opressor daqueles momentos parece ter-se dissipado no vento, e parece, ainda, de difícil convencimento aos contemporâneos de que seus inimigos atuais não podem ser vistos ou tocados: estão individualmente ocultos num esquadrinhamento sutil de leis, regras e comportamentos (as mais imperativas são tácitas e ética e oficialmente imorais – A Assembléia Constituinte de 1988, a propósito, deveria figurar nos panteões pela Literatura pela concepção da Constituição Nacional, a maior obra nacional de ficção do século XX).

Na verdade, o discurso da revolta foi absorvido pelo próprio sistema, que o tratou de pasteurizar e considerá-lo uma conduta aceitável (às vezes até fetichizada, vide a indústria da marca Che Guevara), e, emolduradas por algumas exigências “democráticas”, é capaz de arranhar a superfície do establishment, sem lhe causar maiores estragos estruturais, mantendo inertes os acomodados e os furiosos saciados, sem promover, entretanto, quaisquer mudanças significativas.

Sobre o outro viés, a arte em busca do belo e da sensibilidade, não ouso escrever. Sensação é coisa que não cabe em palavra, tão débil em sua ação de representar às pessoas o vivido. Limito-me a dizer que me afirma sua legitimidade assim como a outra, embora não concorde exatamente que sejam concorrentes.

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